Em Qualquer Cidade de Minas Gerais

Em Qualquer Cidade de Minas Gerais

Sempre tive vontade de registrar o meu dia a dia.Na adolescência, babava de inveja , ao ver colegas que tinham um diário.Ali escreviam seus sonhos, as mágoas , o 1º beijo e tal...Tínhamos uma situação financeira e econômica muito instável e não havia a menor possibilidade de comprar um caderno bem bonito, especial e escrito na capa MEU DIARIO. E assim , a adolescência acabou, veio a vida adulta , a super adulta e enfim cheguei na 3ª idade sem nunca ter realizado esse sonho idiota para alguns , terapia para outros e para muitos como eu ,que ainda tenham a insistência e a teimosia em alimentar a criança existente em nós . Então veio a idéia de criar um blog em que pudesse registrar o cotidiano de uma senhora idosa , sem culpas ou medo do ridículo .Hoje é bem melhor porque a gente escreve para o vento, pra gente mesmo.Totalmente irresponsável e sem compromisso de agradar ou não.Simplesmente pelo prazer de falar do seu dia a dia vivido em qualquer cidade de Minas Gerais ou qualquer espaço físico vivenciado por mim.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

A Madrinha de Casamento


A MADRINHA DE CASAMENTO


Estava terminando de corrigir os cadernos dos alunos e preocupada em torcer a roupa ainda antes do almoço, quando o telefone toca:” E aí? Já se preparou para o casamento? “ “Claro” respondi como se tivesse entrado em outra dimensão. Depois de bla...bla..., desliguei o telefone e, exatamente neste momento, começou minha tragédia. Misericórdia! Tinha me esquecido totalmente. O que fazer? Como num filme rápido foi passando: o presente digno de uma madrinha que teria de arrumar, o vestido digno de madrinha que nem passava de longe, a possibilidade dele existir no meu modesto guarda-roupa, despesas com o cabelereiro, manicure , semblante alegre e descontraído entre tanta gente que nem sonhava o que era dificuldade financeira.
O semblante alegre e descontraído queria dizer : “Estou aqui feliz e sem nenhum problema financeiro e econômico. Estou conseguindo manter a mim e meu filho , trabalhando muito, é verdade, mas (imagine! era professora) muito bem remunerada. ”Isto foi a mais ou menos uns 30 anos atrás. E observando os dias atuais ,pouca coisa mudou. Isto é, grande parte das pessoas ainda insiste em aparentar abundância, bens materiais inexistentes. Continua ainda, o velho “valho pelo que tenho e não pelo que sou”...Enfim, eu não queria que ninguém soubesse que eu não tinha dinheiro nenhum e vivia exatamente como antes de ficar viúva.
Daí é que começou minha peregrinação, pois meu marido fazia das “tripas o coração” pra manter a “tal das aparências.” Então seu círculo de amigos tinha nível de vida bem mais elevado. E entre eles um casal com filho para casar. O casal parecia gostar muito dele e desejando homenageá-lo o convidou para padrinho de casamento do filho. O casal fez o convite como se fosse uma espécie de honra, deferência...
Meu marido assim se sentiu, imagine!!! Que honra.... Só que o marido morreu e eu fiquei.
No meu pobre cérebro da época, imaginava que este tipo de compromisso social deixava de existir com a morte do parceiro. E, com este pensamento me dirigi para a figura feminina do casal expondo o corte do compromisso. A figura feminina não concordou e ainda me jogou a responsabilidade de representar o meu companheiro.”Em absoluto, fazia questão da representante do “amigo querido” no casamento.”
Assim ela falou. Me vi então, na obrigação de comparecer, temendo alguma desgraça do falecido sobre a minha cabeça.
Fazer um empréstimo. Era a única saída. Pelo meu salário o empréstimo teria de ser pequeno. Pelo tanto de dinheiro conseguido, tive de optar: ou comprava um vestido ou o presente dos noivos. Decidi pelo presente dos noivos, afinal eu seria a madrinha.Faltava o bendito vestido.
O vestido veio de uma colega de trabalho, sem nenhum entendimento de moda ou de freqüentar pessoas tão “gabaritadas” ...Aliás o vestido era de uma tia com passado nebuloso, segundo ela, mas garantiu ter ido a festas, casamentos e era o melhor que ela tinha.Por falta de tempo e já tranqüila pelo problema estar resolvido, deixei pra pegar o vestido na véspera.
No inicio fiquei um pouco chocada, pois era um vestido negro de grandes estampas amarelas e um acentuado decote nas costas. Ainda por cima era longo.Pensei em inventar uma doença qualquer , cair de propósito e quebrar o pé, sumir.
Novamente o medo do falecido, me levou a por panos quentes. Comecei então embaçar a visão e a diminuir as estampas amarelas... de repente o decote não era tão grande assim...e, na aflição de ficar livre de tudo aquilo o mais depressa possível me vesti e fui. Afinal seria rápido, logo após o término da cerimônia sairia correndo pro meu canto. De qualquer modo não iria mesmo pra festa do após, eu era recém viúva, nem ficaria bem.
Agora bem mesmo, nunca poderia me sentir ao ser olhada e reolhada com tanto desdém. Foi um verdadeiro pesadelo.A própria irmã do noivo falou claramente algo quem nem lembro. Parece, estava combinado de o noivo entrar com a madrinha, não me lembro bem. Mas me lembro da revolta do noivo e da sua fala bem clara, irritada e dirigida diretamente a mim, sobre não entrar comigo daquele jeito, desfilando na igreja, nem morto.
Eu? Estava emudecida e pensando: Meu Deus tanto sacrifício pra nada.... Vou ficar pagando um empréstimo no maior sacrifício... Deixei meus afazeres mais importantes pra vir... E o que é pior, NUNCA GOSTEI DE FESTAS DE CASAMENTOS.
Chegando a casa, tomei um bom banho demorado, tentando limpar qualquer vestígio de humilhação e terror. Fui até a janela e falei para o vento como se o falecido pudesse ouvir. SE TE DEVIA ALGO, FOI tudo PAGO de forma bem cara. E FOI A ÚLTIMA VEZ QUE TE REPRESENTEI neste tipo de evento que você tanto gostava, ESTOU LIVRE DOS SEUS COMPROMISSOS sociais DEIXADOS POR AQUI. E ASSIM FOI.

Uma Manhã do Ano de 1993


Hoje reli um escrito feito no ano de 1993 .Achei interessante e vou posta-lo aqui.


QUALQUER DIA DO ANO DE 1993



Rapidamente me levantei para atender o telefone .Fiquei indecisa sem saber ao certo onde me encontrava.Com a lentidão dos que acordam de um sono muito profundo e prazeiroso, automaticamente falei: “Alô...” “Você não vai?” Perguntou uma voz feminina.Meia sonâmbula, sem entender direito o que ou quem era, respondi: “Aonde...?”. A voz se tornou mais alta, enérgica, brincalhona respondendo: “Acorde! Temos de andar “. Só ai reconheci a voz e ela continuou, “ei! Se localiza.Estamos em Valadares, no ano de 1993 e são seis horas da manhã.Temos de andar, nadar, nos movimentar, esqueceu? Estamos caminhando para a 3ª idade.Olha a osteoporose!” E m segundos fiquei bem desperta e me esforçando forte pra não ficar mal humorada e apelando pro meu passado genético de humano civilizado, respondi: “ Hoje não será possível...tenho alguns compromissos...aproveite bastante,ta?”.
Voltei pra cama e tentei redormir.Porém, o estrago já tinha sido feito.A sugestão clara da minha caminhada para a 3ªidade ficou ecoando nos meus ouvidos.Por que diabos teríamos de ir para a tal 3ª idade?Tentei me lembrar e fixar na memória de pessoas altamente comentadas como maravilhosas por defenderem a beleza natural deste período, da sabedoria adquirida e como era bom chegar aos 60, 70 e 80 anos , com visão tão bonita de vida.Algumas eram até mais enaltecidas por desprezarem cirurgia plástica ou, segundo elas, vaidades fúteis que apagassem os registros(rugas) faciais de suas belas e construtivas vivências.Isto sim é que era modelo de mulheres fortes,nível intelectual elevado, tal tal...
O que será que acontecia comigo? Afinal SÓ tenho(este só é comparado aos 60..., 70..., e 80) 53 anos.Uma pontinha de inveja da tranqüilidade destas maravilhosas senhoras, começou a crescer.
Como seria bom, sereno, tranqüilo se eu não tivesse vaidades ¨tolas¨, tipo sonhar com plástica, viver me exercitando para tentar manter músculos mais rígidos...! Que paz seria não ter de ficar toda noite, na maior mão de obra, usando cremes ¨milagrosos¨, na esperança de amanhecer mais jovem! Ah! Que bom seria me preocupar apenas com o tanto de sabedoria e encarar os meus registros corporais deixados pelo tempo, como se fossem lindos diplomas expostos dos vários cursos de vida.Imagine a glória,pudesse eu, desprezar com galhardia e superioridade o estar ficando velha.Então ..., deixaria meus cabelos ficarem brancos,terminando de vez com o martírio das pinturas.Alguém já imaginou a loucura que fica um banheiro, pertencente a mulher sem poder aquisitivo de pagar tingimento capilar num salão de cabelereiro? Se puder ter pelo menos noção, entenderá porque eu carregaria com heroísmo a bandeira do saber envelhecer e do respeito a natureza no seu determinismo humano obedecendo as fases nascer,crescer e morrer.
É..., tem hora que fico pensando, se não estarei é sendo influenciada pela mídia no enaltecimento a juventude.É difícil ficar imune aos Outdoors imensos com jovens belíssimas, TV apresentando mulheres estonteantes ( sempre jovens) associadas a produtos de consumo. O pior é a constatação do grande sucesso de tais produtos, provando a preferência de todos, pelas mulheres saídas da adolescência.
E o que acontece? A gente passa a consumir porque associamos o produto oferecido a beleza e a mocidade e, mesmo com conhecimento das finalidades propagandísticas,gostamos de nos iludir ao consumi-lo, na esperança que,sabemos falsa, estaremos de alguma forma , ligadas a jovialidade.
Pensando tudo isto, comecei a imaginar que bem que poderia haver um meio em que fosse dado uma ordem a todas as células humanas para quando chegassem a um determinado ponto, se estabilizassem.A partir daí, não poderiam mais envelhecer.Uma vez o Chico Anísio,comediante de TV, fez um comentário sobre este assunto que não pude deixar de aplaudir entusíasticamente. S egundo ele, a vida poderia começar com você nascendo bem velho.A seguir iria rejuvenescendo em etapas.De bem velho chegaria a meia idade, daí a adulto, jovem, adolescente, criança e quando chegasse a bebê, desapareceria.Não seria interessante?
Acho sensacional algo assim.Sem desesperos ou sofrimentos.Não que não admire mulheres lutando contra o tempo.É claro que sim.A Jane Fonda, atriz famosa,por exemplo, me fascina pela sua luta.O problema é a sua ¨luta¨.Luta aqui quer dizer: 2 horas de aeróbica(incluindo 1 hora de natação), 1 hora pra caminhar,1 hora de musculação na academia, 1 hora de massagista e visitas assíduas ao médico geriátrico.Tirando o médico geriátrico, o restante é diário.Ah! Segundo alguns , os exercícios pra valer mesmo devem ser feitos a partir das 5 horas da manhã.Não sei bem o porque de se exercitar tão cedo.Creio nunca suportar tal desespero.O máximo que consigo é me exercitar 1 a 2 vezes por semana bem amargurada e mal humorada.Isto porque o meu relógio biológico me aponta A NOITE, como melhor horário para qualquer tipo de atividade ou produção com algum sucesso.De formas que levantar cedo pra mim, se assemelha a alguma invenção sofisticada do Marquês de Sade.
A melhor solução mesmo, seria não precisar de nada disto.A gente poderia continuar estabilizada a partir dos 30 anos.Fez 30 anos, pronto.O corpo continuaria saudável, sem ameaças de osteoporose, reumatismos,perda da memória ou qualquer tipo de doença da última idade.Com certeza não haveria o perigo de ser acordada as 6 horas da manhã para ser lembrada de se exercitar,se movimentar o mais que puder.Poderá até optar em não ir, como fiz,porém, estará de modo veloz perdendo a luta contra a Lei Orgânica da Gravidade, isto é, flacidez mais rápida, pelancas caindo, órgãos internos cansados, enfim , toda você cada vez mais inclinada, atraída para o solo.Triste, não?